VISITANTES

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

LIBERDADE

A prisão não são as grades, e a liberdade não é a rua; existem homens presos na rua e livres na prisão. É uma questão de consciência.então a liberdade significa responsabilidade. É por isso que tanta gente tem medo de ser livre, e nada é mais livre do que a imaginação humana. por tanto não deixe de sonhar, pós quem sonha supera suas limitações, e Também ultrapassa seus limites.


pense nisso

@@@petroleo bruto@@@

sábado, 4 de setembro de 2010

A RENÚNCIA IMPOSSÍVEL

NEGAÇÃO

Não creio em mim

Não existo

Não quero eu não quero ser

Quero destruir-me

atirar-me de pontes elevadas

e deixar-me despedaçar

sobre as pedras duras das calçadas

Pulverizar o meu ser

desaparecer

não deixar sequer traço de passagem

pelo mundo

quero que o não-eu

se aposse de mim

Mais do que um simples suicídio

Quero que esta minha morte

seja uma verdadeira novidade histórica

um desaparecimento total

até mesmo nos cérebros

daqueles que me odeiam

até mesmo no tempo

e se processe a História

e o mundo continue

como se eu nunca tivesse existido

como se nenhuma obra tivesse produzido

como se nada tivesse influenciado na vida

se em vez de valor negativo

eu fosse zero

Quero ascender

elevar-me até atingir o Zero

e desaparecer

Deixai-me desaparecer!

Mas antes vou gritar

Com toda a força dos meus pulmões

Para que o mundo oiça:

- Fui eu quem renunciou a Vida!

Podeis continuar a ocupar o meu lugar

Vós os que mo roubastes

Aí tendes o mundo todo para vós

para mim nada quero

nem riqueza nem pobreza

nem alegria nem tristeza

nem vida nem morte

nada

Não sou Nunca fui

Renuncio-me

Atingi o Zero

E agora

vivei cantai chorai

casai-vos matai-vos embriagai-vos

dai esmolas aos pobres

Nada me pode interessar

que eu não sou

Atingi o Zero

Não contem comigo

para vos servir as refeições

nem para cavar os diamantes

que vossas mulheres irão ostentar em salões

nem para cuidar das vossas plantações

de algodão e café

não contem com amas

para amamentar os vossos filhos sifilíticos

não contem com operários

de segunda categoria

para fazer o trabalho de que vos orgulhais

nem com soldados inconscientes

para gritar com o estômago vazio

vivas ao vosso trabalho de civilização

nem com lacaios

para vos tirarem os sapatos

de madrugada

quando regressardes de orgias noturnas

nem com pretos medrosos

para vos oferecer vacas

e vender milho a tostão

nem com corpos de mulheres

para vos alimentar de prazeres

nos ócios da vossa abundância imoral

Não contem comigo

Renuncio-me

Eu atingi o Zero

E agora podeis queimar

os letreiros medrosos

que às portas de bares hotéis e recintos públicos

gritam o vosso egoismo

nas frases “SÓ PARA BRANCOS” ou COLOURED MEN ONLY”

Negros aqui brancos acolá

E agora podeis acabar

com os miseráveis bairros de negros

que vos atrapalham a vaidade

Vivei satisfeitos sem colour lines

sem terdes que dizer aos fregueses negros

que os hotéis estão abarrotados

que não há mais mesas nos restaurantes

Banhai-vos descansados

nas vossas praias e piscinas

que nunca houve negros no mundo

que sujassem as águas

ou os vossos nojentos preconceitos

com a sua escura presença

Dissolvei o Ku-Klux-Klan

que já não há negros para linchar!

Porque hesitais agora!

ao menos tendes oportunidade

para proclamardes democracias

com sinceridade

Podeis inventar uma nova história

inclusivamente podeis inventar uma nova mística

direis por exemplo: No princípio nós criamos o mundo

Tudo foi feito por NÓS

E isso nada me interessa

Ah!

que satisfação eu sinto

por ver-vos alegres no vosso orgulho

e loucos na vossa mania de superioridade

Nunca houve negros!

A África foi construida só por vós

A América foi colonizada só por vós

A Europa não conhece civilizações africanas

Nunca houve beijos de negros sobre faces brancas

nem um negro foi linchado

nunca matastes pretos a golpes de cavalo-marinho

para lhes possuirdes as mulheres

nunca estorquistes propriedades a pretos

não tendes nunca tivestes filhos com sangue negro

ó racistas de desbragada lubricidade

Fartai-vos agora dentro da moral!

Que satisfação eu sinto

por não terdes que falsear os padrões morais

para salvaguardar

o prestígio a superioridade e o estômago

dos vossos filhos

Ah!

O meu suicídio é uma novidade histórica

é um sádico prazer

de ver-vos bem instalados no vosso mundo

sem necessidade de jogos falsos

Eu elevado até o Zero

eu transformado no Nada-histórico

eu no início dos tempos

eu-Nada a confundir-me com vós-Tudo

sou o verdadeiro Cristo da Humanidade!

Não há nas ruas de Luanda

negros descalços e sujos

a pôr nódoas nas vossas falsidades de colonização

Em Lourenço Marques

em New York em Leopoldville

em Cape Town

gritam pelas ruas

fogueteando alegrias nos ares

- Não há negros nas ruas!

Nunca houve

Não há negros preguiçosos

a deixar os campos por cultivar

e renitentes à escravização

já não há negros para roubar

Toda a riqueza representa agora o suor do rosto

e o suor do rosto é a poesia da vida

Viva a poesia da vida!

Viva!

Não existe música negra

Nunca houve batuques nas florestas do Congo

Quem falou em spirituals?

Os salões enchem-se de Debussy Strauss Korsakoff

que não há selvagens na terra

Viva a civilização dos homens superiores

sem manchas negróides a perturbar-lhe a estética!

Viva!

Nunca houve descobrimentos

a África foi criada com o mundo

O que é a colonização?

O que são os massacres de negros?

O que são os esbulhos de propriedade?

Coisas que ninguém conhece

A história está errada

Nunca houve escravatura

Nunca houve domínio de minorias

orgulhosas da sua força

Acabei com as cruzadas religiosas

A fé está espalhada por todo o mundo

sobre a terra só há cristãos

VÓS sois todos cristãos

Não há infiéis por converter

Escusais de imaginar mais infidelidades religiosas

para justificar

repugnantes actos de barbarismo

Não necessitais enviar mais missionários

a África

nem nos bairros de negros

Nunca houve mahamba

nem concepções religiosas diferentes

nunca houve religiosos a auxiliar a ocupação militar

Acabai com os missionários

os seus sofismas

os seus milagres

inventados para justificar ambições e vaidades

Possuis tudo TUDO

e sois todos irmãos

Continuai com os vossos sistemas políticos

ditaduras democráticas

isso é convosco

Explorai o proletariado

matai-vos uns aos outros

lutai pela glória

lutai pelo poder

criai minorias fortes

apadrinhai os afilhados dos vossos amigos

criai mais castas

aburguesai as ideias

e tudo sem a complicação

de verdes intrusos

imiscuir-se na vossa querida

e defendida civilização de homens

privilegiados

E agora

homens irmãos

daí-vos as mãos

gritai a vossa alegria de serdes sós

SÓS!

únicos habitantes da terra

Eu artingi o Zero

Isto significa extraordinariamente a vossa ética

Ao menos

não percais a ocasião para serdes honestos

Se houver terramotos

calamidades cheias ou epidemias

ou terras a defender da evasão das águas

ou motores parados em lamas africanas

raios vos partam!

já não tereis de chamar-me

para acudir as vossas desgraças

para reparar os vossos desastres

ou para carregar com a culpa das vossas incúrias

Ide para o diabo!

Eu não existo

Palavra de honra que nunca existi

Atingi o Zero

o Nada

Abençoada a hora

do meu super-suicídio

para vós

homens que construís sistemas morais

para enquadrar imoralidades

O sol brilha só para vós

a lua reflecte luz só para vós

nunca houve esclavagistas

nem massacres

nem ocupações da África

Como até a história

se transforma num tratado de moral

sem necessidade de arranjos apressados!

Os pretos dos cais não existem

Nunca foram ouvidos cantos dolentes

misturados com a chiadeira do guindaste

Nunca pisaram os caminhos do mato

carregadores com sem quilos às costas

são os motores que se queimam sob as cargas

Ó pretos submissos humildes ou tímidos

sem lugar nas cidades

ou nos escaninhos da honestidade

ou nos recantos da força

dançarinos com a alma poisada no sinal menos

polígamos declarados

dançarinos de batuques sensuais

Sabeis que subistes todos de valor

atingistes o Zero sois Nada

e salvastes o homem

Acabou-se o ódio

e o trabalho de civilização

e a náusea de ver meninos negros

sentados na escola

ao lado de meninos de olhos azuis

e as extorções e compulsões

e as palmatoadas e torturas

para obrigar inocentes a confessar crimes

e medos de revolta

e as complicadas demarches políticas

para iludir as almas simples

Acabaram-se as complicações sociais!

Atingi o Zero

Cheguei à hora do início do mundo

e resolvi não existir

Cheguei ao Zero-Espaço

ao Nada-Tempo

ao eu coincidente com vós-Tudo

E o que é mais importante:

Salvei o mundo!
 
 
 
( Agostinho Neto – 1949 - Primeiro Presidente de Angola )